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segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Dia de não folia

Acorda, toma banho, escova os dentes. Coloca o tênis confortável ou aquela sapatilha amaciada, porque afinal, agora não existe mais a obrigação do terno sempre, de estar sempre impecável. Embora antes não fosse uma exigência, era uma obrigação, parte do trabalho. Agora posso ir trabalhar de flanela, arrumada ou mais largada, do jeito que for. Saio correndo, tiro o carro da garagem, dirijo a minha vida.

Centro da cidade fervilhando, movimentado. Trabalhar um pouco mais tarde dá nisso, mas meu sono agradece. Estaciono na frente do jornal quando tenho sorte. Cumprimento os vigias, que sorriem alegremente. As moças da portaria são todas meio iguais e sempre me olham indagadoras.

Primeiro pego um copo cheio de café. Sento na mesa, abro o e-mail, desisto das redes sociais, faz muito tempo que não me interesso mais como costumava ser. Abro a agenda, elenco as pautas, coloco os assuntos do dia. Pauta marcada pras 10 horas, saio correndo de bloco na mão, caneta em punho. O fotógrafo vai no banco da frente, e a repórter do Arte e Lazer (eu) atrás. Amenidades do dia a dia. "Você foi no Cordão da Valu ontem, cobrir?", e eu respondo que nem fui a trabalho, era minha folga. Fui mesmo pra pular carnaval contrariando minha própria personalidade. Fui de vestido rodado e batom vermelho, tomei chuva e dancei no asfalto, porque eu precisava fugir um pouquinho de ser eu mesma. Fui menina faceira na chuva por algumas poucas horas, me embalei em samba e em marchinhas com os cabelos colados no rosto, vi olhos me encarando, olhei de volta com a mesma intensidade, bebi e deixei aquele aguaceiro lavar tudo que me incomodava e levar rua afora, gelei até os ossos e não me importei. Mas nada disso sai da minha boca na conversa. "Fui sim, e estava legal apesar da chuva".

O motorista pega um caminho diferente do habitual e ali, no meio da rua, avistamos um acidente. O carro imediatamente para, e descemos pra ver o que aconteceu. De carnaval, de dança e alegria, pra uma moça que se acidentou de moto. O braço dela se estilhaçou contra o vidro do carro, e ela berrava e gritava e chorava enquanto o Corpo de Bombeiros tentava remove-la dali, debaixo do veículo. Não consigo olhar por muito tempo, e relanceio apenas os ossos expostos e o pedaço do corpo completamente esfolado. Converso com o motorista  do jornal pra não encarar, porque meu estômago pode me trair. Por sorte, outro repórter cobre a pauta, sendo da editoria certa. Uma constatação: editoria de Cidades/Polícia não é meu forte.

De volta na redação, o telefone louco, incessante. "Mataram uma moça na Vila Alba". "O desfile de carnaval do grupo especial foi adiado". Chuva nas janelas, coloco o fone no ouvido pra me concentrar no texto. Cinco mil toques, capa, fotos. Texto pronto, ideias formatadas. 

Mais café.

Mais vivência, mais rua. Mais chuva, mais asfalto, por favor. É que só assim que eu me sinto viva por esses dias. 

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